Paulo Navarro | segunda, 16 de outubro de 2023

Entrevista com Wagner Tameirão. Foto: Cássia Cinque

A Memória do Futuro

O diretor do Memorial Minas Gerais Vale, Wagner Tameirão, é um homem inquieto, rápido no gatilho e “antenado”. Resultado de quase 30 anos nos férteis campos da Cultura. Mas pegou a estrada para a vocação muito antes. É formado em Comunicação Social - Publicidade e Propaganda, pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, e pós-graduado em Administração em Marketing pela Fundação João Pinheiro. Tem diversos cursos na área de gestão cultural. Agora, continua aprendendo e ensinando no Memorial Minas Gerais Vale, espaço cultural do Instituto Cultural Vale e integrante do Circuito Liberdade. É gestor e curador de fundamentais programas. Também atua como professor de gestão e produção cultural. É o idealizador e coordenador dos festivais "Horizontes Urbanos - Mostra Internacional de Dança em Espaços Urbanos" e o “1, 2 na Dança”. Foi Presidente da Estação Conhecimento Vale do Jequitinhonha coordenando projetos sociais e culturais em mais de 20 municípios. Trabalhou na gestão do Teatro Alterosa de 1994 a 2011. Nesta entrevista, parece que ele está apenas começando, mas o tempo é outro, Wagner está mesmo é continuando, nos vales e montanhas de Minas.

Wagner, 29 anos em gestão cultural. Passou rápido, conseguiu realizar muitos sonhos?

Sempre gostei muito da cultura. Sou um consumidor cultural desde a adolescência, quando fui fazer teatro como exercício de desinibição. O teatro mudou minha vida. Minha formação profissional foi em publicidade e propaganda, atuei muito tempo na área de audiovisual, mas aos 25 anos voltei para a cultura como produtor e gestor de teatro e estou na área até hoje. Muitos sonhos e projetos foram realizados. Esta trajetória é um eterno aprendizado no contato com artistas, produtores e gestores de cultura. 

Um prazer complicado, eterno desafio? 

Em 2020, a economia da cultura e das indústrias criativas - ECIC do Brasil movimentou R$ 230,14 bilhões, 3,11% do Produto Interno Bruto - PIB. Os dados são do Observatório Itaú Cultural, o que demonstra o importante papel da cultura. A cultura transforma a sociedade e contribui para a qualidade de vida. E, nós, trabalhadores da área enfrentamos desafios como a oscilação da economia e da legislação de incentivos a todo momento, mas ao mesmo tempo aprendemos a nos reinventar. 

No currículo, também a Dança e sempre o Teatro, correto?

As artes cênicas e a música foram minha primeira escola, quando estive à frente da gestão do Teatro Alterosa. E no contato com a produção do estado, demonstrei grande interesse pela Dança. O ano era 2004 e vários bailarinos estavam no mercado mostrando um trabalho mais autoral, foi quando nasceu o “1, 2 na Dança – Mostra de solos e duos”. E em 2007, queríamos experimentar a Dança em espaços abertos em diálogo com a arquitetura. Assim nasceu o “Horizontes Urbanos – Mostra Internacional de Dança em Espaço Urbano”. 

O que é o Instituto Cultural Vale?

Criado em 2020, o Instituto Cultural Vale parte do princípio de que viver a cultura possibilita às pessoas ampliarem sua visão de mundo e criarem perspectivas de futuro. Tem um importante papel na transformação social e busca democratizar o acesso, fomentar a arte, a cultura, o conhecimento e a difusão de diversas expressões artísticas do nosso país, ao mesmo tempo em que contribui para o fortalecimento da economia criativa.

E o Memorial Minas Gerais Vale? Memorial de quê?

O Memorial Minas Gerais Vale apresenta a história, a cultura e as tradições de Minas em espaços interativos e surpreendentes. Foi desenvolvido a partir do conceito de “museu de experiência”, com exposições que utilizam arte e tecnologia de forma intensa e criativa, proporcionando a interação do público com o seu conteúdo. São 22 salas com exposições de longa duração, espaços de convivência e eventos; espaços para o desenvolvimento de programação temporária com exposições, shows, poesia, espetáculos para crianças, seminários e palestras com o objetivo de dialogar com o meio cultural mineiro e oxigenar o espaço. São mais de 200 eventos culturais promovidos por ano, com destaque para o “Boa Noite Memorial” que este ano recebeu 25 mil pessoas.

Qual o tamanho, o papel do Instituto Cultural Vale, no Brasil?

O Instituto Cultural Vale é um dos maiores investidores privados da cultura brasileira via recursos da Lei de Incentivo. Está presente em mais de 100 museus e centros culturais pelo Brasil, com patrocínios a exposições, instituições e investimento na troca de saberes em estruturas de governança, programas educativos e intercâmbios culturais. Em 2020-2022, patrocinou mais de 600 projetos em mais de 24 estados e no Distrito Federal. Dentre eles, uma rede de espaços culturais próprios, patrocinados via Lei Federal de Incentivo à Cultura, com visitação gratuita, identidade e vocação únicas: Memorial Minas Gerais Vale (MG), Museu Vale (ES), Centro Cultural Vale Maranhão (MA) e Casa da Cultura de Canaã dos Carajás (PA).

Ufa!

Mantém ainda o Programa Vale Música, com polos em quatro estados - Pará, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e Minas. O programa autoral envolve cerca de 250 profissionais e mais de mil crianças e adolescentes em aulas, masterclasses, intercâmbios e residências artísticas. As principais referências da música de concerto do país são parceiras do Programa Vale Música: a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo - OSESP, a Orquestra Sinfônica Brasileira - OSB, a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, a Orquestra Ouro Preto e a Nova Orquestra. As cinco orquestras são patrocinadas por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura.   

Por falar em Minas...

O Instituto Cultural Vale é o maior apoiador da Cultura em Minas Gerais. O investimento no estado foi de mais de R$ 198 milhões. Entre 2019 e 2021 houve aumento de mais de 300% no valor total de patrocínios. Para execução em 2023, o investimento via Lei Federal em MG foi de R$ 66 milhões, destinados a 54 projetos. 

E Brumadinho?

Recentemente foi anunciada parceria inovadora com o Inhotim, patrocinado pela Vale há mais de dez anos, voltada para o desenvolvimento socioeconômico de Brumadinho. Serão aportados R$ 400 milhões em até dez anos, visando garantir a gestão sustentável e ampliação do acesso ao museu, além de fortalecer o setor turístico-cultural na região.  

Existe um segredo para somar as tradições ao contemporâneo?

Mais que um espaço dedicado às tradições, origens e construções da cultura mineira, o Memorial Minas Gerais Vale é trânsito e cruzamento entre a potência da história e as pulsações contemporâneas da arte e da cultura. Um lugar onde presente e passado estão em contato direto e renovação. É dinâmico, transformador e criador de confluências com artistas independentes e com  diversos segmentos da cultura mineira. O que move um espaço cultural é a sua inquietude e o Memorial sempre se preocupou em ampliar o seu público e furar as barreiras físicas da sua importante edificação para promover novos diálogos e experiências. 

Cultura transforma? Como?

A cultura salva, alimenta e transforma. Na pandemia sentimos falta de frequentar teatros, shows, cinema, festas de rua, museus, galerias e centros culturais. Acredito na cultura com a capacidade de promover o bem-estar. Foi assim que nasceu o projeto “Sensações Memoráveis”, do Memorial Vale. Uma forma de aproximar a cultura com as conexões de bem-estar.

Quais os grandes destaques da tua gestão?

Manter o Memorial como um espaço aberto à cultura, dando espaço e voz às diferentes manifestações culturais, promovendo diversidade, inclusão e inspirando novas formas de ver e sentir a arte. A proposta tem sido incluir ações cada vez mais inclusivas, independente de classe social, nível de escolaridade, idade, gênero ou deficiência. Destaco os projetos “Diversidade Periférica”, “Boa Noite Memorial”, o “Edital Novos Artistas Mineiros”. Mais de 360 atividades artísticas foram realizadas por agentes de cultura de Minas em plataformas digitais e disponibilizadas pelos canais virtuais do Memorial, no período de isolamento.

Planos para 2023 ou, agora, só 2024?

Ainda este ano, duas exposições temporárias, sendo uma delas “Imagens que não se conformam”, circulação nacional com patrocínio do Instituto Cultural Vale. Até o final do ano, o programa educativo continua recebendo visitas mediadas e promovendo formação de professores. Neste mês de outubro, 19 eventos. Em novembro, o Seminário de Produção Preta é uma iniciativa do Instituto Aya e do Memorial Vale.